terça-feira, 16 de junho de 2009

A Alameda...

A ALAMEDA DAS PALMEIRAS
E O GUARDIÃO DA MORTE



Era tarde. Eu anoitecia. Liguei os holofotes.
Vibravam em direção à alameda, com suas palmeiras
a espiar as estrelas e a relva gotejando rasteira e quieta.

Não me recordo agora, de quantas dores e insatisfações
desfilaram sob as luzes curiosas que acendia.
Poucas sei que não foram. Muitas hão de percorrer esse caminho...

Não faz muito tempo, conheci alguém que ao passar por mim,
resolveu parar e descansar.
Um ser estranho, diferente do que sou.
Decidi conhecê-lo melhor. Há muito o observava à distância.
Carregava tanta tristeza... Eu podia vê-la. Isso me intrigava.
Aproveitei a ocasião para esclarecer minhas dúvidas.
A cada movimento daquele ser eu percebia a dificuldade
de compreensão consumir sua singular existência.

Coloquei-me à disposição, tornando minha aparência
semelhante a sua. Cheirava. Ouvia. Olhava.
Sentia. Falava. Pensava...
Seu nome era Constância.
Mulher jovem de aparência.
Disse ser uma escritora famosa.
Contava algumas histórias fictícias,
outras da realidade de sua existência.
Ouvia com paciência, sem conseguir satisfazer
a curiosidade que me perseguia.
Num dado momento, percebi que seu olhar parava nas águas.
Foi assim que descobri, a dor que vinha assolando os passageiros
da Alameda das Palmeiras.

Pude ver nas águas, aquele belo ser humano, agonizando.
Num átimo, voltava seu olhar para o meu confirmando minha suspeita:
os seres humanos, não admitem a morte e não suportam a vida.
Constância, como os outros que por ali passaram, estava morrendo...
Para se justificar, a jovem retirou de sua bolsa um manuscrito, que dizia:
"Tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo.
Seremos todos loucos? Possivelmente não.
Ou seria certo se dizer que todos um dia ficaremos privados de lucidez?
Não creio. Apenas sei de como me sinto e sou.
Como vejo esse mundo obscuro e surdo às lamentações que surgem,
ecoando das montanhas e vales sombrios da existência.
Pura vergonha existir. Covardia persistir.
Há de se encontrar a coragem emergencial da morte como opção de vida.

Não sei bem a que tipo de vida me refiro, mas a qualquer outra forma de ser.
Talvez, quem sabe, noutra dimensão.(Devaneio)...
Os loucos não devaneiam? Serei eu a próxima vítima da incompreensão?
As mãos ao transpirarem fazem com que a caneta
escorregue entre os dedos, as palavras somem,esquecidas,
perdidas na imensidão do inconsciente...
O horror se compõe com a vontade e cria-se um novo amanhã.

Manhã silenciosa, macia, clara...
Pássaros livres saltam dos olhos ardentes de luz...
As águas da sabedoria falam às margens, encobrindo de umidade
as raízes sombrias, profundamente fixas aos seus interesses e objetivos...
Breve nos veremos Virgínia Woolf..."

Adeus Constância!
Guardo a lembrança daqueles últimos momentos seus...
Preciso desligar os holofotes!...

Autora Ligia Tomarchio

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